segunda-feira, 20 de outubro de 2008

A atuação da mídia e o caso Santo André


A história é típica dos últimos capítulos da novela das oito. O obcecado ex-namorado descobre pelo orkut que a sua "ex" está "ficando" com outro garoto. Ele não aceita o término do namoro e muito menos o fato da menina iniciar um novo relacionamento, invade a casa da garota armado e faz refém quatro jovens: Eloá- a ex-namorada-, Nayara- a melhor amiga- e dois adolescentes que estavam no apartamento da jovem para realizar um trabalho escolar de Geografia.

O enredo foi perfeito para a mídia que espetacularizou mais uma vez um drama da vida real. E preparem-se porque agora é a hora dos desdobramentos do final trágico do caso. Agora vamos preparar nossos ouvidos para escutar "os especialistas". É o capítulo três dessa minissérie. São psicólogos que desvendam a mente de Lindemberg, e respondem as perguntas de como um jovem aparentemente normal age desta forma, e aplicam teorias que explicam o porquê do desfecho trágico. Os peritos forenses que contratados pelas emissoras de TV fazem a reconstituição da cena do crime, dizendo: - Não esta almofada não estava do lado direito, mas sim do esquerdo... ; é realmente esse orifício na lateral esquerda da parte superior da parede foi feito por um projétil...

São também "os palpitadores" de plantão que ganham espaço. A Record News agora quer que VOCÊ, amigo telespectador, ligue para lá e dê a sua opinião sobre o caso, o que você acha do final da história, dos policiais, da trajetória da bala que atravessou o cérebro de Eloá?

Sou claramente a favor da participação do espectador, da tão famosa interatividade. Mas vamos com calma, a televisão já é redundante por natureza, contudo a rede Record consegue deixar a informação redundante ao quadrado. O telespectador é quase que chamado de imbecil. Eles utilizam este tipo de recurso para alimentar o senso comum e sugar o máximo possível, até a exaustão a última gota de sangue do caso. Foi assim com a Isabela e provavelmente será assim com este também. Infelizmente o caso é tão explorado que perde o seu potencial de comoção e acaba caindo na banalidade um tempo depois. A televisão deve ser repensada, principalmente do ponto de vista deste tipo de cobertura jornalística.

Eu e Clarinha estivemos na última sexta-feira, dia 17, na Pró-Conferência Nacional de Comunicação, na ALERJ (Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro). Muita gente com o discurso demagógico da antiga esquerda tentou alvoroçar a platéia, idéias boas e ruins sobre o rumo da comunicação foram lançadas. Mas o motivo central do encontro, a criação de uma Conferência Nacional de Comunicação, se faz como uma necessidade para que a população tenha uma qualidade melhor de informação. A legislação a qual as emissoras de TV, por exemplo, são subordinadas está desatualizada. O Código Brasileiro de Telecomunicação, pasmem, é de 1962. E obviamente não é respeitado pelas grandes empresas que deveriam ter em sua grade pelo menos cinco horas diárias de programação educativa,e apenas 25% de publicidade. Para se ter uma idéia de como esse universo é completamente sem lei, as concessões da Rede Record, da Rede Globo e da Band estão vencidas.


O Estado tem que ter um pulso firme com a maneira como a comunicação é realizada no país, transformar seqüestrador em “super star”? Abrir o microfone para ele, conceder o tempo que for para o Sábio Senhor Lindemberg falar ao vivo para todo o Brasil? É isso que ele queria. O circo foi todo montado, e ele foi o protagonista do espetáculo como quis. Todos, polícia, advogado e imprensa dançaram de acordo com a música que Lindemberg escolheu, com direito até ao retorno de ex-refém para o cativeiro (alguém já viu isso?), os figurantes seguiram os passos como o tutor queria e tiveram o final que menos esperavam.


O que eu instigo com todo esse blá blá blá, é que você pense um pouco mais no papel da mídia nesse tipo de cobertura. Até que ponto a exploração do fato e da imagem são realmente eficazes e necessárias? O papel da imprensa jornalismo é relatar e não interferir nos fatos. E será que no caso Santo André simplesmente relataram?

Jaque

Um comentário:

  1. Parabéns pelo texto Jack. Muito bem elaborado e muito inteligente. A ilustração também é magnífica!

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